quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Rupnik, el Miguel Ángel del siglo XXI

Labirintos


LABIRINTOS



Labirintos de Igreja
O labirinto mais antigo implantado no pavimento de um edifício religioso de que se tem conhecimento data do séc. IV d.C. e encontra-se na Argélia. É o ‘missing link’ entre o labirinto romano e o labirinto das catedrais - chamado "cristão medieval". Tem a forma do labirinto romano (quatro quadrantes), mas no centro, em lugar da mitológica luta entre Teseu e o Minotauro possui a inscrição ‘Sancta Ecclesia’, ela própria um labirinto que se pode ler a partir do centro em todas as direções, menos na diagonal.
Embora os investigadores não estejam todos de acordo acerca do primeiro labirinto construído em solo italiano, parece que este símbolo tenha migrado para Itália, país onde existe, depois de França, o maior número de labirintos de igreja. Entre os bonitos labirintos italianos o mais conhecido é talvez o labirinto mural da catedral de São Martinho, em Luca, que servia para ser percorrido pelos dedos e que contém a seguinte inscrição:
Eis aqui o labirinto de Creta
construído por Dédalo e do qual ninguém
pode escapar, uma vez aí entrando,
senão Teseu com a ajuda do fio de Ariadne.
No início do séc. XIII é construído o labirinto da catedral de Chartres, em França, e a partir dessa altura proliferou em cerca duas dezenas de edifícios religiosos franceses, existindo actualmente em cerca de uma dezena. A sua designação era chemin de Jérusalem e la Lieue, e o centro era conhecido como Ciel.
Se a sua função, durante a Idade Média, era ser percorrido de joelhos pelos fiéis como forma de substituir a peregrinação a Jerusalém, é um tema ainda controverso, sabe-se, com certeza, que nessa altura servia de palco a um jogo/dança ritual em que entravam os clérigos adstritos à catedral. As descrições da peregrinação é mais tardia, havendo informações do séc. XVII, onde se lê que era praticada durante a Páscoa.
Na Escandinávia, onde parece não existirem labirintos em pavimentos de igrejas, existem cerca de 30 exemplares desenhados e gravados em sinos, pilares, abóbadas, muros, cruzes, etc. Ainda não se tem a certeza quanto à sua datação, mas pensa-se que tenham sido feitos a partir do séc. XIII.

Perdendo grande parte do protagonismo inicial, devido aos vários acontecimentos religiosos e políticos havidos na Europa, o labirinto parece ter "adormecido" durante séculos (pelo menos a sua construção), para reaparecer no séc. XIX em quatro edifícios religios ingleses e numa igreja de Colônia, na Alemanha.
No século XX opera-se o grande renascimento pelo interesse da utilização do labirinto como caminho para o encontro de cada um consigo mesmo e com a divindade. Aparecem então labirintos em catedrais da África do Sul, na Alemanha, etc.
Esse movimento deve-se a Laura Artress, pastora da Grace Cathedral e psicoterapeuta norte-americana que fez construir na sua catedral uma réplica do labirinto de Chartres para ser percorrido pelos fiéis. A partir de então o labirinto torna-se um "utensílio espiritual" que serve de meio para tomadas de consciência em muitos dos movimentos e organizações da New Age, e há mesmo um design particular concebido por uma outra pastora americana no qual se realizam casamentos!
Quase se pode dizer que hoje todas as semanas (ou todos os dias), é construído, desenhado, ou percorrido um labirinto nos Estados Unidos, país em que está sedidada a Sociedade do Labirinto, e onde se realiza todos os anos o maior evento mudial relacionado com o tema.
Mas o labirinto não existe apenas em edifícios religiosos num contexto religioso cristão, pois na Índia e no Paquistão ele encontram-se gravado em pilares de templos e mesquitas...

domingo, 28 de agosto de 2011

A Mais Antiga Imagem do Apóstolo Paulo

CATACUMBAS DE ROMA REVELAM A MAIS ANTIGA IMAGEM DO APÓSTOLO PAULO



Arqueólogos do Vaticano usando tecnologia laser descobriram nas paredes da catacumba de Santa Tecla, nas entranhas de Roma, aquela que julgam ser a mais antiga imagem conhecida do apóstolo Paulo, datando de finais do 4º século.
O "achado" foi revelado no passado Domingo pelo jornal Observatore Romano, do Vaticano, que publicou a fotografia do fresco com a imagem da face de um homem com a testa enrugada, e uma barba preta pontiaguda dentro de uma áurea amarela, num fundo vermelho.
A descoberta sensacional, que envolveu a remoção de camadas de barro e cal utilizando raios laser foi anunciada um dia antes da celebração romana do dia de S. Paulo e S. Pedro (feriado nacional).
O túmulo de Paulo foi também recentemente descoberto e exames provam a existência de restos de uma pessoa do 1º ou 2º século d.C., dando evidência à suspeita de que se trata realmente do apóstolo dos gentios.
Paulo - o grande missionário judeu - levou o Evangelho aos gentios e crê-se que foi decapitado em Roma por volta do ano 65 d.C. Foi o autor humano de uma grande parte dos escritos do Novo Testamento, e a sua conversão de judeu ortodoxo fariseu a seguidor de Jesus deu-se de forma dramática, tendo encarado Jesus face a face, tornando-o no mais ousado apóstolo, evangelista e pastor de almas de sempre. Nenhum outro judeu sofreu tanto pela causa do Messias como este homem.
Podemos dizer que, a seguir ao próprio Jesus Cristo, este é o Judeu que mais benefícios trouxe à humanidade!
Os cristãos primitivos em Roma sepultavam os seus mortos dentro das catacumbas, no subsolo da cidade e decoravam as paredes dos corredores com imagens devocionais, ao estilo de Pompeia.
Shalom, Israel!

sábado, 27 de agosto de 2011

Raízes Judaicas da Arte Sacra Cristã

Judaica, arte A arte judaica tem suas raízes históricas na arte hebraica da palestina antiga e manteve suas características ao longo dos séculos no seio da diáspora do seu povo. O contato com tão díspares culturas levou, naturalmente, essa arte a assimilar os estilos locais, mas conservando sempre uma essência própria, profundamente religiosa.
Nos tempos bíblicos e durante a ocupação romana, os hebreus foram influenciados pelas artes da Mesopotâmia, que englobava os países vizinhos: Assíria, Babilônia e Fenícia. Desse período só restaram vestígios arqueológicos ou literários, como acontece com o mais citado dos monumentos, o Templo de Salomão, construído em Jerusalém no séc. 10º AC; em ruínas de edifícios na localidade Megido; e no palácio de Ahab, em Samaria, datados de um séc. depois.
O período da ocupação romana levou suas influências para a arquitetura local. Na Palestina foram erguidas numerosas edificações, registrando-se maior atividade durante o reinado de Herodes, como o templo do mesmo nome em Jerusalém (séc. 1º AC) e o Muro Ocidental, que ficou conhecido como “das Lamentações”. Este muro é parte daquele que rodeava o Templo. Nesta época surgiram na cidade o Palácio Massada e um anfiteatro romano. No ano 70 os romanos destruíram o templo de Herodes e obrigaram os hebreus a se dispersar, o que deu origem ao aparecimento de numerosas sinagogas fora da Palestina, edificadas segundo o modelo das basílicas romanas. Nos templos se adotou o costume de separar homens e mulheres,além de haver um santuário reservado à Thora. Estas duas características passaram para as igrejas cristãs primitivas e persistiram nas igrejas orientais.
Nesses tempos prevalecia a crença de que criar arte para reproduzir seres humanos, fosse com desenhos ou esculturas,era idolatria e uma violação dos Mandamentos (o mesmo sucedeu com a arte islâmica). Esta imposição encaminhou os artistas para a criação de ornamentos, representações de modelos vegetais estilizados, objetos de culto e aprimorou o grafismo. Porém, a reprodução naturalista de humanos permaneceu vedada.
As sinagogas antigas possuíam mosaicos, colunas esculpidas, com capitéis de inspiração clássica, frisos cinzelados na pedra e, em seu interior, pinturas de fundo religioso. Consoante os locais onde foram edificadas, adotaram gostos locais, caso da sinagoga Doura-Europos (séc. 3ª, Síria) exemplo do gosto persa mesclado com a tradição helenística da Grécia. Outro remanescente da arte judaica antiga são os mosaicos de Beth Alpha, em Israel. A partir do séc. 11º, além de números testemunhos literários e científicos, restaram livros iluminados, ou seja, ilustrados preciosamente com gravuras coloridas, verificando-se neste campo atividades artísticas consideráveis na Palestina, Egito e Síria.
Os judeus, em sua condição de exilados em muitas partes do mundo, só tardiamente puderam fundar escolas de ensino das artes, resultando as perseguições em grande falta de documentação artística judaica até o séc. 16º. Dois sécs mais tarde, a ênfase na educação e os ventos da emancipação religiosa levaram numerosos judeus para Academias oficiais.Entre estes, muitos interessados nas artes da sua tradição hebraica.
Ao longo da Idade Média européia, a diáspora judaica se espalhou pela Europa, por todo o Oriente Médio e África, onde numerosas escolas e sinagogas foram erguidas, com especial suntuosidade na Europa Oriental, recheadas de murais e esculturas, mas nesta região muitas foram destruídas durante a II Guerra (1939-45), restando raros exemplos antigos, como em Praga, República Checa (Alt-Neuschul – Antiga Escola Nova); e outra em Toledo, Espanha, em estilo mudéjar (onde hoje é o Museo Sefardi d’ El Transito); no séc. 16º foi edificada,em estilo barroco, a sinagoga de Veneza (Itália). Limitações ditatoriais proibiam os judeus de dedicar-se às artes, o que explica sua ausência das listas de artistas do Renascimento.
Paralelamente, a partir de Castela, na Espanha, desenvolveu-se uma escola de arte judaica que se disseminou por toda a Península Ibérica, o mesmo acontecendo na Renânia (Alemanha), após o séc. 13º. Depois, o povo judeu conheceria o drama das perseguições da Inquisição da Igreja. Entre este séc. e o 18º, isto é, atravessando o final da Idade Média, o Renascimento e a Idade Moderna européia, as artes se deslocaram para objetos de culto, como lâmpadas para as sinagogas, pratos, taças, caixinhas, menorahs, etc. Nestes períodos se enriqueceram extraordinariamente os objetos feitos com metais preciosos, como a prata e ouro, além da tapeçaria.
O desenvolvimento do sionismo trouxe alento para a volta a Israel como terra-mãe dos judeus.Em 1906 foi fundada em Jerusalém a Escola de Artes Bezael, que teve como seu fundador Boris Schatz (o nome da Escola evoca o de um lendário artista,escultor, arquiteto e designer, que teria feito o Tabernáculo que continha a Arca Sagrada). A Escola Bezael foi responsável por um primeiro movimento para criar uma arte judaica de caráter internacional.
Ao longo do séc. 20º alguns artistas se notabilizaram com uma arte tipicamente judaica, como o pintor russo Marc Chagall (1887-1985) e o escultor lituano Jacques Lipchitz (1891-1973). Atualmente, de uma maneira geral, os artistas judeus, mesmo aqueles radicados em Israel, adotaram os estilos internacionais, como acontece via de regra mundo afora.

Frei Agostinho de Jesus, Artista Beneditino

Monge-escultor confeccionou a imagem milagrosa de Nossa Senhora Aparecida

Nossa Senhora da Purificação - Frei Agostinho de Jesus (Séc. XVII) Museu de Arte Sacra de São Paulo


O Brasil sempre nos surpreende. Um país tão rico de cultura, com grande variedade artística, conhece muito pouco sobre sua história e aqueles que construíram esta grande nação. No Século XVIII Nosso país conheceu a arte de um dos mais importantes artistas Brasileiros e o precursores da chamada arte barroca colonial. Trata-se de Frei Agostinho de Jesus. Nascido no Rio de Janeiro em 1600, Agostinho de Jesus foi monge Beneditino e um dos discípulos de um outro Agostinho, o da Piedade. Sabe-se que a maioria de suas obras foi criada para os mosteiros Beneditinos, especialmente os Do Rio de Janeiro e São Paulo.
No Mosteiro de São Bento paulistano, encontram-se as mais importantes obras de Agostinho de Jesus. No altar mor da Basílica de Nossa Senhora da Assunção – nome oficial da igreja do Mosteiro – estão as estátuas em tamanho natural de São Bento e de Santa Escolástica.
Assinado no Mosteiro de São Bento de São Paulo, Agostinho de Jesus passou boa parte de sua vida na cidade de Santana do Parnaíba, onde havia um mosteiro, hoje desaparecido.
Os Mosteiros beneditinos sempre foram grandes propagadores da arte e da cultura. Seguindo a mesma tendência, Os mosteiros de São Bento de São Paulo, Santana do Parnaína e Sorocaba também deram sua contribuição às artes. Tais mosteiros se concentraram como grandes difusores da escola artística de barro cozido – arte bandeirante. É aqui que Frei Agostinho de Jesus ganha destaque. Sua influência foi tamanha chegando aos santeiros populares. Acredita-se que sua obra tenha inspirado o trabalho do mestre do barroco brasileiro, Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho.
Ainda hoje, a influência artística de Frei Agostinho de Jesus nos alcança com grande força. Um dos maiores símbolos brasileiros, a imagem milagrosa de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, Padroeira do Brasil, situada na Basílica Nacional em Aparecida do Norte, São Paulo, foi confeccionada por este ilustre beneditino. A catalogação da obra de Agostinho de Jesus se deve a um outro ilustre beneditino, Dom Clemente Maria da Silva Nigra. Com maestria incomparável Dom Clemente reuniu toda obra de nosso artista e a partir de pesquisas minuciosas de estilemas e demais técnicas, atribuiu a imagem de Aparecida a Frei Agostinho de Jesus.
O monge-escultor Agostinho de Jesus morreu em São Paulo em 1661.
frei Agostinho de Jesus - Murilo Sá Toledo (2001) Santana do Parnaíba, São Paulo
Em Santana do Parnaíba, no ano de 2001, houve um reconhecimento singular a este grande religioso-artista brasileiro. Foi inaugurado na cidade um monumento, a estátua de Frei Agostinho de Jesus no seu ofício de escultor. A estátua faz alusão à produção da imagem de Nossa Senhora Aparecida. Esculpida pelo artista plástico parnaibano Murilo Sá Toledo, a estátua de Frei Agostinho de Jesus e pode ser vista no Largo São Bento – local originário do Mosteiro beneditino onde viveu o escultor.
Ir. João Baptista Barbosa Neto, OSB

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

A CIVILIZAÇÃO DA IMAGEM QUE FRAGMENTA E O SÍMBOLO QUE LEVA AO CENTRO
P/Cassiano Rocha Azevedo baseado no livro  “A Vida do Símbolo: A dimensão simbólica da religião” de José Maria Mardones, São Paulo, Paulinas, 2006.
“Símbolo provém do termo grego symbolon, derivado do verbo sym-ballein, que em seu sentido primeiro significa “lançar com, por junto com, juntar”. Isto significa uma dualidade; depois uma unificação: junto duas coisas, formando uma só. Duas pessoas assumem um matrimônio; não perdem totalmente a sua individualidade. Não obstante são feitas para estar juntas. A unificação não se faz por redução à unidade ou por fusão, mas por ajustamento.”¹
                O símbolo é um tipo de conhecimento e aproximação da realidade invisível, é uma exposição indireta e analógica daquilo que nos transcende; é um reino da inspiração, da evocação, da metáfora, da indicação. Encontramos no âmbito do não possuído, da realidade que se evoca e nunca se esgota. O símbolo é a linguagem da transcendência. Tem a capacidade de ser exposição, no sensível, de nossos deslumbres e mistérios; ele dá palavra ao silêncio do inefável e hospedagem à transcendência. O símbolo quer unir o rompido e o fraturado, estender uma ponte sobre o separado e situado em dois âmbitos diferentes.
                Quando se deseja penetrar no segredo da realidade, somente se consegue pelo caminho do símbolo, da imagem, do mito Como exemplos destacamos o livro bíblico dos Cânticos dos Cânticos, as poesias de São João da Cruz, os ícones orientais feitos em oração. (colocar fotos)
                O símbolo vive da evocação e inspiração do ausente. Por esse motivo não se dá bem com a pretensão de exibição da civilização da imagem. O predomínio ditatorial da imagem em nosso mundo pode ser lido como indicador de uma decadência da palavra e, mais ainda, do símbolo. A primeira destas consequências é a opressão do símbolo pela imagem.
                A civilização da imagem tem uma lógica secreta que percorre a ciência e a técnica moderna manifestando uma busca da verdade que se pretende exibir bem à nossa frente. O ideal perseguido é poder expressar o que existe na realidade, de tal maneira que seja visível. A racionalidade moderna caminha para uma decomposição analítica, que, no fundo, quer evidenciar, visualizar o segredo guardado pela realidade. A pretensão é trazer à luz dos olhos, da imagem retiniana, as coisas tais e quais elas são.
                Quisemos trazer à luz a introspecção e esta se converteu em exibicionismo. Vivemos numa época de voyeurismo; convertendo-nos em curiosos. Há ai o vestígio do fascínio e do mistério que é o outro, mas também indica a carência de conhecimento de nós mesmos e a pobreza das relações com o outro, que não vão além da pele do trivial. Ansiamos pelo sentido, pelo encontro interpessoal e carecemos de preparação e até de meios para procurá-lo.
                A imagem está a serviços das relações comerciais. Em nossa sociedade, a publicidade recorre a toda simbologia, inclusive a religiosa, para vender seu produto. (colocar uma propaganda de um homem casando com um carro)
O futebol se transformou num símbolo da globalização. Essa cultura de massa cria a diversão planetária com equipes e jogadores, verdadeiros ídolos que substituem os cantores e artistas. Esta cultura de consumo cria um sincretismo mundial, rápido e mutável funcionando em ritmo de videoclipe. Gera uma ecológica planetária; ícones globais ligados à cultura popular e de massa, como Marylin Monroe, Mao TSE-tung e Che Guevara.
Hoje, existe uma nova estratégica que destrona a primazia das relações de produção: “a apoteose das relações de sedução”, trabalho sócio psíquico que transforma a realidade e seus objetos em meros sinais de consumo. A aparência é o novo nome das vestes das relações mercantis. Tudo fica reduzido a um valor mercantil e significado de consumo.
                Assim, a imagem se converte em instrumento a serviço da sociedade de sensações, veículo de excitação e até produto de consumo. Este mercado de sensações faz com que o sujeito saia de si mesmo e o alienam na projeção momentânea sobre o objeto insinuado. A imagem se transforma em instrumento a serviço da fuga de si mesmo e na imersão no mundo dos produtos e das marcas, da simulação, da fantasia.
                Esse deus oculto dos índices de audiência, o rating, reina sobre as consciências e sobre os programas. O mercado nos meios de comunicações acaba exercendo uma violência simbólica que esconde mostrando, que chama atenção sobre o que não interessa, preenchendo as mentes, manipulando.
                Nessa era da globalização e da sociedade das sensações, a civilização da imagem ameaça, com sua ditadura, o equilíbrio mental e o bom desenvolvimento do homo sapiens. O crescente aumento dos espectadores ou consumidores passivos nos pode levar a uma sociedade de “tele-servos”: indivíduos dependentes das mensagens que os senhores do ar nos enviam, que converterão espectador em massa, roubando a capacidade reflexiva, impedindo-lhe de qualquer discernimento.
                Estamos a um passo da “modernidade líquida”, como falou Z.Baumam, na qual os indivíduos não possuem fins, critérios e escolha racional. Movem-se numa super-oferta de possibilidades diante da necessidade de estabelecer prioridades e não sabem como. Nesta modernidade não há um centro ou núcleo sólido, mas uma massa fluida, líquida, que se expande e penetra todos os meandros, mas cujo poder não está nos EUA ou no G-8; é extraterritorial, eletrônico, oculto e anônimo.
                O poder, praticamente onipresente, mas não localizável, percorre não o sistema e sim a rede, seduz mais do que impõe, aconselha mais que lidera. Nesta sociedade, os indivíduos se voltam totalmente para si mesmos e seus interesses, porque são inimigos declarados dos cidadãos ou pela sociedade justa.
                Se a imaginação é obstruída por uma indigestão ou pela sensação de viver na perfeita liberdade, que sentido tem palavras como liberdade, justiça, igualdade, libertação e onde irão buscar sua força motivadora?
                Quando o fluxo de imagens prolifera, o feixe de sensações estimula uma gratificação imediata que submerge o indivíduo em um presentismo indefinido. Ficamos presos ao imediato e ao dado, sem poder passar para o sentido das coisas. A discussão sobre a validade ou não de um gol de Ronaldo converte-se na questão fundamental da maioria dos cidadãos. A imagem, repetida à saciedade, serve de objeto de manipulação e liquidação do sentido.
                Gera-se um neopaganismo cultural e social de enormes dimensões. Jean-Luc Marion o chamou de “mundo idolátrico”, no qual domina um ídolo que anula toda referência ao transcendente,
A imagem busca a vida e, curiosamente, a perde por estar totalmente centrada em sim mesma e em sua própria busca. De fato, a imagem somente poderá ser salvadora, isto é, evocadora de vida, quando estiver consciente de seu potencial redutor e negativo. Somente o símbolo pode sugerir e evocar o caminho. O símbolo é o guia para os nômades no deserto, que têm apenas algumas pistas nessa busca da terra prometida.
 Procuremos selecionar as imagens que entram por nossa retina e cercar-nos de uma linguagem simbólica que nos conduza ao transcendente.

Maria ao pé da cruz

Jorge de Nicomedia - (séc. IX)

Beijo a tua paixão,
com a qual fui libertado das minhas más paixões.

Beijo a tua Cruz,
com a qual condenaste o meu pecado
e me libertaste da condenação à morte.

Beijo aqueles cravos,
com que removeste o castigo da maldição.

Beijo as feridas dos teus membros,
com que foram curadas as feridas da minha rebelião.

Beijo a cana com que assinaste o atestado da minha libertação
e com que feriste a cabeça arrogante do dragão.
Beijo a esponja encostada aos teus lábios incontaminados,
com que a amargura da transgressão
me foi transformada em doçura.

Tivesse podido eu degustar aquele fel,
que dulcíssimo alimento não teria sido!

Tivesse podido eu tomar o vinagre,
que bebida agradável!

Aquela coroa de espinhos
teria sido para mim um diadema régio.

Aquelas cusparadas
me teriam ornado como esplêndidas pérolas.

Aquelas zombarias
me teriam ornado como sinal de profundo obséquio.

Aquelas bofetadas
me teriam glorificado como o prestígio mais alto.

Eu te beijo, Senhor,
e a tua paixão é o meu orgulho.

Beijo a lança que dilacerou o documento da minha dívida
e abriu a fonte da imortalidade.

Beijo o teu lado do qual jorraram os rios da vida
e brotou para mim o rio perene da imortalidade.

Beijo a tua mortalha com que me adornaste
tirando-me minhas vestes vergonhosas.

Beijo o preciosíssimo sudário de que te revestiste
para envolver-me na veste dos teus filhos adotivos.

Beijo o túmulo
no qual inauguraste o mistério da minha ressurreição
e me precedeste pela estrada que sai do Hades.

Beijo aquela pedra
com a qual me tiraste o peso do medo da morte.


Bento XVI

Bento XVI: Igreja deve recuperar sua própria tradição musical
Papa festeja os 100 anos do Pontifício Instituto de Música Sacra
CIDADE DO VATICANO, quarta-feira, 1º de junho de 2011 (ZENIT.org) - Por ocasião das celebrações do centenário de fundação do Pontifício Instituto de Música Sacra, Bento XVI enviou uma carta ao grão-chanceler do Instituto, cardeal Zenon Grocholewski, que a leu no último dia 26, na abertura do congresso internacional de música, que se estendeu até esta quarta-feira.
O Instituto, explicou o Papa, depende da Santa Sé e "faz parte da singular realidade acadêmica constituída pelas universidades pontifícias romanas", ao ser relacionado de maneira especial ao Ateneu Santo Anselmo e à Ordem Beneditina.
Para captar claramente a identidade e a missão, observou, "é oportuno recordar que o Papa São Pio X o fundou oito anos depois de ter emanado o Motu proprio "Tra le sollecitudini", de 22 de novembro de 1903, com o qual levou a cabo uma profunda reforma no campo da música sacra, voltando à grande tradição da Igreja contra as influências exercidas pela música profana, especialmente operística".
Esta intervenção magisterial "precisava, para a sua realização na Igreja universal, de um centro de estudo e ensino que pudesse transmitir de modo fiel e qualificado as linhas indicadas pelo Sumo Pontífice, segundo a autêntica e gloriosa tradição que remonta a São Gregório Magno".
Nos últimos 100 anos, o Instituto "assimilou, elaborou e transmitiu os conteúdos doutrinais e pastorais dos documentos pontifícios, como também do Concílio Vaticano II, concernentes à música sacra, para que possam iluminar e guiar a obra dos compositores, dos maestros de capela, dos liturgias, dos músicos e de todos os formadores neste campo".
Continuidade
O Pontífice, portanto, quis sublinhar "um aspecto fundamental, que lhe é muito querido": como, desde São Pio X até hoje, "apesar da natural evolução, a substancial continuidade do Magistério sobre a música sacra na liturgia".
Em particular, observou, Paulo VI e João Paulo II, à luz da constituição conciliar "Sacrosanctum Concilium", quiseram reafirmar o fim da música sacra, isto é, "a glória de Deus e a santificação dos fiéis", e os critérios fundamentais da tradição.
Entre estes, o Papa recordou "o sentido da oração, da dignidade e da beleza; a plena adesão aos textos e aos gestos litúrgicos; o envolvimento da assembleia e, finalmente, a legítima adaptação à cultura local, conservando ao mesmo tempo a universalidade da linguagem; a primazia do canto gregoriano, como modelo supremo de música sacra, e a sábia valorização das demais formas expressivas que fazem parte do patrimônio histórico-litúrgico da Igreja, especialmente (mas não só) da polifonia; a importância da "sachola cantorum", em particular nas igrejas catedrais".
"Sobre a base destes sólidos e seguros elementos, aos quais se acrescenta uma experiência já secular, eu vos convido a levar adiante, com renovado ímpeto e compromisso, vosso serviço na formação profissional dos estudantes, para que adquiram uma séria e profunda competência nas diversas disciplinas da música sacra", concluiu.

Música sacra deve levar à nostalgia do transcendente
Entrevista ao cardeal Zenon Grocholewski
ROMA, quarta-feira, 1º de junho de 2011 (ZENIT.org) - A música sacra tem de levar a viver algo de transcendente, diferente da completa banalidade dos cantos que não se adaptam à oração e que são apenas barulho.
É o que afirma o cardeal Zenon Grocholewski, prefeito da Congregação para a Educação Católica e grão-chanceler do Pontifício Instituto de Música Sacra, nesta entrevista a ZENIT, durante um congresso em Roma.
ZENIT: Como se harmoniza a música sacra com as novas tendências?
Cardeal Grocholewski: O problema não é fácil. Trata-se, por um lado, de unir a tradição da Igreja e, por outro, de dar possibilidades às novas contribuições musicais. Por isso Pio X fundou o Instituto, para estudar a problemática. Aqui estudam pessoas do mundo todo. É para formar as pessoas e sensibilizá-las quanto ao papel da música sacra.
ZENIT: Como a música sacra se integra na liturgia?
Cardeal Grocholewski: A música sacra é uma parte integrante da liturgia, e, portanto, tem que ser uma oração que expressa aquele momento. Ela não é um acessório, ela é essencial. Neste congresso, falaram mais de cem pessoas, dos mais variados ambientes, e elas deram uma contribuição para entender como conciliar a tradição com elementos novos que podemos agregar.
Hoje observamos uma completa banalidade desses cantos que não se adaptam à oração, que são apenas barulho. A liturgia precisa também de silêncio.
Por outro lado, o canto é oração coerente com a eucaristia. Na verdade, no passado, grandes músicos fizeram composições estupendas referentes à missa, como Giovanni de Palestrina. Todos fizeram muitas coisas estupendas propícias à oração.
ZENIT: Hoje talvez fosse necessário voltar a ter um pouco mais de música sacra nas igrejas, não?
Cardeal Grocholewski: Sim, seria preciso reforçar a compreensão da música sacra. Há novas composições, muitas vezes eu as ouço nas igrejas, completamente novas e muito bonitas. Por exemplo, no ano passado eu estive em Marselha, onde tinha celebrado para alguns juristas numa igreja que quase foi demolida, porque não havia fiéis.
Chegou um padre novo, e, agora, aos domingos, aquela igreja está cheia. Entre outras coisas, por causa do canto e da oração. São composições dele. Esse padre, antes de entrar no seminário, cantava nos cabarés de Paris, depois se converteu e se ordenou padre. Eu fiquei fascinado de ver que composições dele expressam a oração! Isso é oração e aquela igreja enche!
Na saída, perguntei às pessoas e muitas me diziam que vinham de longe “porque aqui se reza, o padre prega e nós o entendemos, e há uma bela música”.
ZENIT: O senhor falou de sacralidade. O que é sacralidade?
Cardeal Grocholewski: A sacralidade se expressa na medida em que se manifesta a oração, como nostalgia por algo, na medida em que se expressa a transcendência. Eu acho muito importante. Hoje, por exemplo, algumas músicas modernas, que escutamos na televisão, não têm nada de transcendental, são pura diversão aqui na terra, não têm nostalgia de nada.
Claro, não é fácil de definir, não é uma coisa física, material, se bem que existe sensibilidade na Igreja, que sabe reconhecer quando uma coisa é sacra ou não é.
ZENIT: Em alguma oportunidade, um prelado dizia que a música na liturgia nos leva a viver o que será o paraíso. O que a música sacra nos dá?
Cardeal Grocholewski: Muitas coisas belas sobre a música sacra foram escritas por Ratzinger antes de ser Papa. Agora saiu uma opera omnia de Ratzinger, e na Itália saiu um volume justamente sobre a liturgia, com 200 páginas sobre música sacra. São coisas muito bonitas. Com razão, Bento XVI sublinha que a música sacra tem que nos levar para outro mundo, para uma nostalgia do transcendente.
Não é mero som que nos tira da realidade. O Papa fala que quando se perde esse horizonte transcendente da vida humana, tudo se reduz ao terreno, mesmo a música e a profundidade do pensamento. A música tem que abrir espaço para o transcendental.
ZENIT: Há certo consenso na Igreja de que o órgão é o instrumento sacro por excelência, sem excluir outros?
Cardeal Grocholewski: Acho que sim, eu acho que, quando uma pessoa entra numa igreja, o órgão cria uma atmosfera, dá certa plenitude. Em muitas igrejas modernas, inclusive importantes, procura-se conservar o órgão.
ZENIT: O senhor daria algum conselho aos párocos, especialmente aos mais jovens?
Cardeal Grocholewski: Eu acho que precisamos sensibilizar as pessoas para a música sacra, aquela que é oração. Claro que não é possível criar um lindo coro em cada paróquia. Mas é necessário sensibilizar as pessoas sobre a sacralidade do canto que se interpreta na igreja.

Onde está a beleza?

Onde está a beleza
Uma região na parte frontal do cérebro "acende" quando desfrutamos a beleza de uma obra de arte ou de uma música agradável.
Os cientistas afirmam que a única característica comum a todas as obras de arte, qualquer que seja sua natureza, é que todas levam a uma atividade nessa mesma região do cérebro.
Eles sugerem que isto de certa forma vem apoiar a opinião do filósofo David Hume, que argumentava que a beleza está em quem vê, e não no objeto.
Neurobiologia
"A questão de saber se existem características que tornam os objetos belos tem sido debatida há milênios por artistas e filósofos da arte, mas sem uma conclusão adequada," afirmou o professor Semir Zeki, da Universidade College London, no Reino Unido.
"O mesmo tem acontecido com a questão de se temos um sentido abstrato da beleza, isto é, algo que desperta em nós uma experiência emocional poderosa, independentemente de sua origem ser, por exemplo, musical ou visual. Era hora da neurobiologia abordar estas questões fundamentais," afirmou.
Arte no consultório
Os voluntários, de diferentes culturas e etnias, observaram uma série de pinturas e trechos de música - tudo classificado previamente como bonito, indiferente ou feio - deitados dentro de um aparelho de ressonância magnética funcional, que mede a atividade no cérebro.
O professor Zeki e seu colega Tomohiro Ishizu descobriram que uma área na parte frontal do cérebro conhecida como córtex órbito-frontal medial - parte do centro de prazer e recompensa do cérebro - ficou mais ativo quando os voluntários ouviam uma música ou olhavam uma imagem classificadas como bonitas.
Por outro lado, nenhuma região particular do cérebro foi correlacionada com obras de arte classificadas como "feias".
Conceito abstrato de beleza
O córtex órbito-frontal medial tem sido ligado à apreciação da beleza, mas esta é a primeira vez que os cientistas mostraram que a mesma área do cérebro é ativada para a beleza visual e para a beleza auditiva nos mesmos indivíduos.
Isto, segundo os dois cientistas, implica que a beleza, "de fato", existe como um conceito abstrato dentro do cérebro - o artigo que relata a pesquisa chama-se Rumo a uma Teoria da Beleza Baseada no Cérebro.
Professor Zeki acrescenta: "Quase tudo pode ser considerado arte, mas nós defendemos que apenas criações cuja experiência se correlaciona com a atividade no córtex órbito-frontal medial cairia na classificação de arte bonita," afirmou Zeki.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

1. Aula - O Sagrado e o Profano


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1.Slides da aula



Surpresa no museu do Vaticano



Surpresa nos Museus Vaticanos
A coleção de Matisse faz um tributo à Verdade
Por Elizabeth Lev* 
ROMA, segunda-feira, 27 de junho de 2011 (ZENIT.org) - Quando se pensa nos Museus Vaticanos, é a arte do Renascimento o que logo vem à mente. Por isso os visitantes se surpreendem ao ver que o mesmo museu que abriga Rafael e Michelangelo também tem estrelas modernas no firmamento.
Neste 22 de junho, o Vaticano atraiu atenção internacional para a sua coleção de arte do século XX apresentando mais um tesouro: a arte de Henri Matisse.
A galeria de arte moderna religiosa, localizada nos apartamentos de Alexandre VI e no porão da Capela Sistina, contém jóias pouco conhecidas, como uma Pietà de Van Gogh, pintada pouco antes de sua morte em 1890, e pinturas religiosas de Chagall.
Matisse não foi o mais cristão dos artistas: ele se definia agnóstico, mas aberto à fonte da beleza. E a Providência o levou, no final dos seus dias, a trabalhar para a Igreja.
Nascido em 1869, Matisse já tinha começado a estudar Direito quando decidiu se dedicar à pintura. Foi aluno de Gustave Moreau e, pouco depois, em 1905, co-fundou o fauvismo. Refletindo o espírito da época, o fauvismo foi um movimento de paganização, que glorificava a sensação intensa através da arte. Depois da I Guerra Mundial, Matisse rejeitou todo tipo de sofrimento em seus trabalhos e fez grande sucesso com suas cores alegres e desenhos chamativos, criando esculturas, pinturas e até vestuário para o teatro. Mudou-se para o sul da França, atraído pelas cores do Mediterrâneo.
Em 1941, depois de uma difícil e dolorosa operação de câncer, passou longo tempo de cama, com dor constante. Seu mundo brilhante chocou-se com a realidade do sofrimento. Monique Bourgeois, que cuidou dele, marcou o artista profundamente com sua caridade e bondade. Em 1946, Monique se tornou religiosa e entrou para o convento dominicano de Vence, trocando de nome para irmã Jacques Marie.
Foi quando surgiu a ideia de construir uma nova capela para o convento de Vence, dedicada ao terço. Matisse, a irmã Jacques Marie, a irmã Agnes de Jesus, superiora do convento, um irmão dominicano, Rayssiguier, e o padre dominicano Marie-Alain Couturier, começaram a trabalhar para transformar o sonho em capela. Completamente comprometido com o projeto, Matisse vendeu suas litografias para conseguir dinheiro. Seu velho amigo Picasso ficou horrorizado: “Uma igreja! Por que não um mercado? Pelo menos você poderia pintar frutas e verduras!”.
Matisse fez centenas de esboços do trabalho, pintando as paredes na cadeira de rodas, com um pincel enganchado a uma vara extensível. Desenhou cada aspecto da capela: os vitrais coloridos, as vestimentas e até um crucifixo de bronze para o altar. O artista sempre planejou doar os esboços a um museu, dizendo que “seria uma loucura que eles e as janelas permanecessem no mesmo lugar”.
Os esboços dos vitrais foram doados ao Vaticano há 30 anos pelo filho do artista, Pierre, de acordo com seus irmãos Margarita e Jean, e, em 1980, chegaram à coleção do Vaticano. Também foi doada a correspondência entre Matisse e a irmã Agnes de Jesus, sobre o desenvolvimento da capela. As cartas testemunham o crescimento do primeiro projeto religioso de Matisse.
O grande esboço de Maria com o Menino Jesus, realizado para a decoração em cerâmica, foi exposto na Galeria de Arte Religiosa Moderna, mas a exposição nunca fez justiça ao trabalho nem representou a importância da doação. As cartas, por sua vez, ficaram sem publicação.
Matisse abriu a capela em junho de 1951. Exatamente 70 anos depois, os Museus Vaticanos abrem a nova sala de Matisse. O financiamento e a ideia do projeto vieram dos patrocinadores dos Museus Vaticanos, particularmente do Capítulo de Montecarlo, a poucas milhas de Vence. Liana Marabini, presidente do Capítulo de Montecarlo, providenciou o necessário para preparar a sala de exposição com equipes de conservação para papel e tecidos, permitindo assim que os Museus Vaticanos ilustrassem a conversão artística de Matisse.
Os esboços dos vitrais estão distribuídos brilhantemente, mas a sala é dominada pelo grande esboço de Maria e do Jesus Menino. O padre Marie-Alain Couturier, conselheiro teológico de Matisse, interpretou as linhas como “cartas escritas apressadamente, sob o impacto de uma grande emoção”. Há também uma cópia do crucifixo de bronze da capela. Um vídeo curto narra os fatos que levaram Matisse à arte religiosa. As cartas ficarão no mesmo espaço, para ser vistas depois de algumas casulas desenhadas pelo artista.
Michel Forti, o curador do departamento de arte religiosa moderna dos Museus Vaticanos, publicará a coleção das cartas de Matisse em dezembro num volume intitulado “Como uma flor: Matisse e a Capela do Rosário de Vence”.
Matisse considerou a capela sua “obra-prima”, apesar de algumas imperfeições. É uma reflexão iluminadora de um homem cuja carreira de 50 anos de duração tinha sido inteiramente dedicada às coisas mundanas. A Sala Matisse do Vaticano é a expressão perfeita da missão do Museu: preservar e honrar um grande exemplo do gênio criativo humano, mas também proclamar que a Verdade inspira tanto a beleza como a bondade.
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Poesia, pintura e procissões
Na última quinta-feira, Roma celebrou a festa de Corpus Christi com as procissões eucarísticas que atravessam a cidade, sendo a mais importante delas a procissão papal de São João de Latrão até Santa Maria Maior. Os cantos encheram o ar e estandartes flutuaram pelas ruas, mas o efêmero dessas visões se desvaneceu depressa. Nos Museus Vaticanos, porém, restaurada há pouco, a “Missa em Bolsena”, de Rafael Sanzio, imortaliza o milagre eucarístico em pedras coloridas.
O Milagre de Bolsena, frequentemente considerado o catalizador da festa de Corpus Christi, recorda um evento ocorrido na Umbria (Itália), em 1263. Um sacerdote chamado Pedro, da cidade de Praga, tinha muitas dúvidas sobre a transubstanciação da Hóstia durante a Missa, e durante sua peregrinação a Roma, rezou para que essas dúvidas fossem resolvidas. Enquanto dizia as palavras de consagração na Igreja de Santa Cristina de Bolsena, a Hóstia começou a gotejar sangue em suas mãos e no pano que havia embaixo.
Um ano depois, o Papa Urbano IV instituiu a festa do Corpus Domini com a bula Transiturus de hoc mundo, e encarregou Tomás de Aquino de escrever a liturgia da festa. O Doutor Angélico escreveu, assim, dois de seus melhores hinos, Pange Lingua Tantum Ergo.
O corporal de Bolsena é ainda conservado na catedral de Orvieto, construída especificamente para albergar esta preciosa relíquia.
Rafael deu sua própria contribuição, imortalizando este milagre quando pintou em 1512 “O Milagre de Bolsena” nos apartamentos do Papa Julio II. A pintura, restaurada, traz o milagre da vida em cores vívidas.
O sacerdote se ajoelha perante o altar, olhando a Eucaristia, que tem uma cruz feita com sangue na Hóstia e no corporal. Seus lábios demonstram surpresa, mas a figura mantém a dignidade que se espera de um celebrante. As reações dramáticas reservam-se para a multidão reunida atrás, pessoas que levantam a cabeça para contemplar o milagre ou viram para contar a quem está ao lado. O altar está marcado por uma arquitetura monumental, absorvida por Rafael através de seu parente, o arquiteto papal, Donato Bramante. Robustas colunas dóricas alcançam o céu e a parte superior da pintura está aberta a um céu atravessado pela luz.
Do outro lado de Pedro de Praga há um dado anacrónico, o Papa Julio II se ajoelha com a cabeça descoberta, e quatro de seus cardeais e um pequeno contingente da Guarda Suíça.
Dois elementos destacam-se no trabalho. O primeiro é a solenidade do clero em oração. Comparada com outros trabalhos da sala – a fuga dramática de Pedro da prisão de Herodes, a perseguição e captura de Heliodoro e a expulsão de Átila, o huno – o olho encontra descanso quando centra sua atenção na contemplação do milagre.
O segundo elemento que se destaca, revelado com a recente restauração, é a cor. Rafael tinha estado em contato com os pintores venezianos nesse período e o novo uso da cor se destaca em meio ao dramático claro-escuro da Libertação de São Pedro e as brilhantes cores metálicas da Expulsão de Heliodoro. As cores de Rafael parecem tangíveis – rico e pesado carmesim que parece ondular. O vermelho do sangue se combina com o branco cru do linho ou da seda.
As qualidades sensoriais da superfície da obra evidenciam a realidade da cena: o sangue que goteja das mãos do sacerdote e o pano marcado com o sangue de Cristo nos tornam real a Presença na Eucaristia, um dos principais temas dos séculos XIII e XIV.
São Tomás com a poesia, Roma em procissão e Rafael com sua obra nos recordam o mesmo tema que o beato João Paulo II destacou em 2004: A Igreja Católica é a Igreja da Eucaristia.
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* Elizabeth Lev leciona Arte e Arquitetura Cristãs no campus italiano da Duquesne University e no programa de Estudos Católicos da Universidade San Tommaso.